A crise econômica bateu em cheio na renda dos brasileiros e, pela primeira vez desde 2010, fez o país cair no ranking de Desenvolvimento Humano das Nações Unidas (ONU). O Brasil passou da 74ª posição para 75ª numa lista de 188 nações que são classificadas com base em três indicadores: saúde, educação e renda. Juntos, esses três fatores são combinados para compor o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), que varia de zero a 1. Quanto mais próximo de 1, maior é a qualidade de vida da população. A renda per capita brasileira anual baixou de US$ 15.288 em 2013 para US$ 15.175 em 2014, recuo de 0,73%.
Em seu último relatório, referente a 2014, o IDH brasileiro foi calculado em 0,755, o que mantém o país no grupo de nações com alto desenvolvimento humano, onde também estão Uruguai, México, Venezuela, Colômbia e Turquia. O número é levemente maior que o registrado em 2013, de 0,752, mas não evitou que o Brasil caísse no ranking. Sri-Lanka, que registrou avanços mais significativos, subiu na lista da ONU.
Entre os países do Brics, o Brasil foi o único que perdeu posição. A Rússia permaneceu na 50ª colocação, a Índia, que está no grupo de médio desenvolvimento humano, subiu de 131º para o 130º. A África do Sul, que está no mesmo grupo da Índia, também avançou uma posição: de 117ª para 116ª. A China teve o melhor desempenho, subiu três posições: de 93ª para 90ª.
‘QUEDA TEM A VER COM RITMO DE CRESCIMENTO’
Os números do Relatório de Desenvolvimento Humano (RDH), onde está o novo ranking do IDH, ainda não refletem o agravamento da crise econômica brasileira este ano. A Renda Nacional Bruta (RNB) per capita usada na composição do IDH foi calculada com base em dados de 2014, quando a economia ficou estagnada. Como a retração esperada da atividade este ano é de 3,5%, a tendência é que o índice piore daqui para frente, alertam os técnicos do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), responsável pelo IDH.
– A queda no ranking tem a ver com o ritmo de crescimento do país – explica a coordenadora do relatório no Brasil, Andréa Bolzon, que avalia que a crise econômica vai afetar os indicadores do Brasil no ano que vem. – É possível que tenhamos impacto já que a gente tem um PIB de menos 3% aí. Isso terá um reflexo na renda e, claro, pode puxar os outros indicadores lá para baixo.
Ela lembra que, em 2014, a situação econômica do país era bem melhor. No ano passado, o PIB avançou 0,1% e a inflação foi de 6,41%. A deterioração foi acelerada de lá para cá. E o Brasil encerrará este ano numa forte recessão entre 3,5% e 4% e com alta média de preços acima de 10%.
Em Teresina, no Piauí, o tratador de animais Fernando José viu seus ganhos minguarem de R$ 1.100 para R$ 724 de um ano para cá. As horas extras foram cortadas juntamente com o salário. Ele conseguiu terminar de pagar o financiamento da moto antes de o salário cair e não tem mais condições de comprar qualquer bem durável por enquanto. O dinheiro agora só dá para alimentação e para ajudar os pais que moram em outra cidade: – As fazendas estão reduzindo pessoal. Tudo hoje é cortado, não tem mais horas extras ou ajuda para viagens. Com a virada do ano, a situação piorou muito. Triste foi cortar a ajuda para meus pais. Conseguia dar a eles R$ 600 por mês, agora só dou R$ 400. Neste Natal nem pensei em comprar nada de presente para eles.
Mesmo com a queda na renda, dificilmente o Brasil deixará de ser considerado um país de alto desenvolvimento humano. Dos 188 países do ranking, os que ocupam as posições 50 a 105 – com índices entre 0,7 e 0,8 – têm essa classificação. Os melhores do ranking ocupam o grupo de muito alto desenvolvimento, com a Noruega figurando na primeira posição.
MELHORA EM EXPECTATIVA DE VIDA E ANOS DE ESTUDO
Além da renda, o IDH também leva em conta a expectativa de vida – como indicador de saúde – e média de anos de estudo e anos de escolaridade esperada como indicadores de educação. Nesses campos, o Brasil avançou.
A expectativa de vida subiu de 74,2 para 74,5 anos: número de vários países da elite do IDH, o grupo de desenvolvimento humano muito alto. Na Noruega – o primeiro do ranking – a perspectiva é viver 81,6 anos. Realidade bem distante do pequeno país africano Lesoto, de baixo desenvolvimento humano, onde vive-se menos de 50 anos.
A média de anos de estudo cresceu de 7,4 para 7,7 anos. Já a estimativa de escolaridade brasileira permaneceu em 15,2 anos pelo quinta edição seguida do ranking. O número está bem abaixo dos 20,2 anos de estudo da Austrália, o país com a maior previsão, mas igual à do Chile, que se encontra na lista dos países com desenvolvimento humano muito alto. No Níger, último do ranking do IDH, os estudantes têm a perspectiva de ficar apenas 5,4 anos na sala de aula.
O IDH brasileiro está acima da média de 0,744 correspondente aos países do grupo de alto desenvolvimento e acima da média de 0,748 dos países da América Latina e do Caribe.
Fonte: GABRIELA VALENTE, CÁSSIA ALMEIDA e EFRÉM RIBEIRO -O Globo